bem, há uma história para ser
contada. e lá vem a minha personagem
central. é aquela moça que aparenta às vezes mais, às vezes menos, do
que tem como registro na certidão de nascimento, e, por ser tão impreciso
dar-lhe primaveras, deixo a seu critério pôr na moça, - veja bem, é uma moça-
idade conveniente.
essa moça não tem nada de
verdadeiramente especial. nunca foi a mais bonita da sala, seu primeiro beijo
não foi lá essas coisas e , na verdade, depois do primeiro demorou para dar o
segundo por medo de uma segunda decepção. estudou em lugares médios, comeu
comidas de tias, avós. houve época conflituosa em sua adolescência: os hippies,
os rocks, as drogas e os hormônios nunca foram boas coisas a serem combinadas. demorou
para menstruar, negou algumas religiões e, hoje , diz que seu único apego
transcendental é com Jesus, contudo um Jesus meio hippie, roqueiro, drogado que
aceita o casamento gay na boa. transou algumas vezes, gozou poucas vezes. mas
gozou. é verdade, porém, ela acha mais simples gozar se masturbando. sente-se
livre para pensar no que quiser e, depois da transa imaginária, ela vira pro
lado, dorme e ronca. e , se não estiver na vibe,
desiste e usa o dedo para coçar o nariz, quem sabe... agora, que conhecemos a
nossa estrela, resta-me dar à moça um fato notório. afinal de contas, não se
narram histórias meãs. e essa é, de fato, uma boa história.
acontece que hoje, nesse exato
momento, um moço, nem feio nem bonito, de estatura média, entretanto, uns dedos
mais alto que a moça, olhou-a nos olhos e disse “Maria?”. nossa moça não se
chama maria. mesmo assim, e talvez os místicos, alquimistas, psicólogos,
psicanalistas, ousados ou bobos saibam
ou queira explicar, ela pensou, em um milésimo de segundo, muitas coisas.
primeiro, que poderia mentir e dizer que sim, seu nome seria maria,depois, que odiaria seu nome verdadeiro pra sempre, e,
por último, que amaldiçoaria para sempre quem teve a ideia ridícula de não
dar-lhe como graça “maria”. os olhos amendoados do moço desenlaçaram a cara
aturdida de nossa companheira já de muitas linhas. sim, não vá você pensar que
eu atenuarei essa história, ou coisa que o valha. não estamos aqui para julgar
ninguém, espero, nem a nossa personagem. então, você não será machista a ponto
de dar-lhe alcunhas depreciativas como “puta” ou coisa parecida só porque, em
poucas horas, ela estava transado com o nosso segundo personagem num motel de
péssima categoria, suando como nunca, gemendo como nunca, de quatro como poucas
vezes teve coragem e vontade de fazê-lo,
por acreditar que é coisa de puta.
enquanto o nosso segundo personagem
segura as ancas da moça, ela desesperadamente lançava o pescoço para trás. é
bem verdade que, quanto ao sexo, é melhor fazê-lo, narrar-lho parece conversa
ora boba, ora vulgar, ora engraçada. acontece que sexo é, pelo menos faz sentido que seja, um
ato irracionalmente animal. se o homem lhe põe muito significado, empobrece. bem
,fazem sexo os babuínos nas savanas africanas, em meio ao olhar de muitos
outros babuínos, à temperatura elevada e clima úmido. tal qual um casal de
babuínos, e na mesma posição que os primatas inferiores fariam, nosso casal faz
amor dando pouco significado às coisas.
uma mão, nesse momento dos mais
íntimos, é apenas uma mão. não há significado em ser mão. há sentido. as mãos do
moço são sentidas firmes nas ancas de nossa protagonista, que agora, dá um
grito lancinante que significa: gozo. levantam-se, beijam-se. fazem sexo mais
uma vez enquanto vestem-se. trocam telefones e , ambos, colocam codinomes ao
passo de pôr na agenda do celular os respectivos e verdadeiros nomes. como se ,
ao olhar para o nome verdadeiro seguido do telefone, enxergassem um pecado
imperdoável que seria posto à ignomínia sem precedentes.
a nossa moça caminha até sua casa
agora... fraca, feliz. estranhíssima. mesmo que tentasse se lembrar não
poderia. ela tentou muito. mas depois desistiu. lembrou-se aos poucos de quem
era. deu-se nome, “meu nome é...” . enfim. chegou em casa e as luzes estavam
acesas.
-demorou?
-trânsito.
- você vai fazer o jantar?
- sim.
- sua mãe te ligou, disse que você
pode mandar a Amanda pra lá no fim de semana, ai você poderá me fazer a tal –
ênfase no tal- surpresa.
-que bom.
quando será época de morangos?
ramonc/
o microcosmos do não amor/
janeiro-2013.
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